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ComCiência

On-line version ISSN 1519-7654

ComCiência  no.118 Campinas  2010

 

ARTIGO

 

Transformações urbanas contemporâneas

 

 

Nadia Somekh

 

 

Hoje, maio de 2010, assistimos à apresentação, pela prefeitura de São Paulo, do conjunto de Operações Urbanas Diagonal Norte/Sul previstas na reunião do plano diretor em debate na Câmara Municipal. Em dezembro de 2008, perguntávamos na Conferência do Urban Age realizada na capital paulista: por que São Paulo não apresentava grandes projetos urbanos como as outras grandes metrópoles?

Levantamos algumas hipóteses para responder a essa questão. Em primeiro lugar, porque ainda não existem instrumentos de gestão metropolitana para articular municípios e definir novas centralidades.Também inexistem instrumentos de gestão urbana que consigam articular interesses privados para construção de espaços públicos de qualidade e, ainda, instrumentos financeiros que permitam a inclusão social. A grande desigualdade social, apesar dos programas de redistribuição de renda federais permanece como marca das nossas cidades.

Como as grandes cidades no mundo tem tratado essa questão? Alguns elementos recorrentes podem ser ressaltados na experiência internacional de projetos urbanos. No caso de Puerto Madero, em Buenos Aires, assinalamos a importância da criação de uma entidade administrativa público-privada para a implementação do projeto. Além disso, destaca-se a recuperação do patrimônio histórico constituído pelos antigos armazéns, a preocupação com a questão ambiental concretizada na implementação de parques, com jardins e espaços públicos generosos. A busca de um programa com a definição de atividades, bem como do uso residencial, também tem seu exemplo na operação do Parc Citroën, no XV eme arrondissement, em Paris, o qual, além da implementação de um parque na área deixada pela indústria automobilística, define atividades do terciário avançado e a mistura de classes sociais na definição do uso residencial.

Essa característica - bem como a definição de uma entidade administrativa central - está presente em todas as operações francesas, que têm no poder público grande agente coordenador e impulsionador, por intermédio de pesados investimentos para alavancar os bons resultados dos projetos propostos.

Nas experiências de Bilbao e na região de Milão, a questão econômica regional é encarada de forma diferenciada. Na primeira, a reconversão industrial exigiu do poder público um esforço de criação de inúmeras entidades de planejamento voltadas para a atração de investimentos (Abascal, 2004). Na segunda, a Agência de Desenvolvimento Milão-Norte, sem a entidade metropolitana, desenvolveu projetos urbanos de resultados voltados a um desenvolvimento endógeno.

Em Bilbao, é emblemática a implantação do Museu Guggenheim como "âncora cultural", assim como, em Milão, o projeto Pirelli da Biccoca do Teatro Scalla 2. Neste caso, a fábrica da Pirelli ainda mantém 10% de sua produção na área, as residências dos trabalhadores foram preservadas, por se constituírem patrimônio histórico recente, e a implantação de uma unidade universitária, com foco na inovação tecnológica, completa a produção de empreendimentos residenciais para estudantes e a população de diversas faixas de renda.

É interessante destacar a atuação da prefeitura de Sesto San Giovanni, na região do norte de Milão, que tem 70% de sua área esvaziada de produção industrial (incluindo parte dos domínios da Pirelli). O esforço dos quadros do município, apoiados pela Agência Norte de Milão, obteve êxito na reconversão de grandes plantas de siderurgia, como a Falck e a Breda, em pequenas e médias unidades produtivas, devido a um esforço de negociação com os sindicatos, resultando na capacitação para o empreendedorismo dos trabalhadores desempregados das grandes unidades metalúrgicas.

Não só em Milão, como também em Londres, na experiência de Docklands, a participação da iniciativa privada, em larga escala, nos empreendimentos imobiliários, só se realiza na medida em que há a implantação de linhas de transporte que criaram uma centralidade, ampliando a acessibilidade para o centro. No caso de Milão, uma linha com apenas duas paradas une a nova centralidade ao norte com o centro da cidade. Em Docklands, a linha Jubilee, implantada em 2000, reafirma o sucesso imobiliário de um projeto anteriormente considerado fracassado, permitindo sua posterior expansão.

Em síntese, os elementos recorrentes apontados pela experiência internacional incluem uma unidade de gestão centralizada, a importância nuclear da questão dos transportes gerando as chamadas novas centralidades, a existência de âncoras culturais, bem como de ambientes ou setores voltados para a inovação tecnológica, além do investimento na ampliação da qualidade dos espaços públicos oferecidos à população. Acrescente-se a essa receita a frequência com que projetos arquitetônicos de grife são encontrados no espaço dessas mesmas experiências, com alguns nomes recorrentes, como Cesar Pelli, Norman Foster, Jean Nouvel, dentre os mais procurados.

Portanto, apesar de ser louvável a iniciativa da prefeitura de São Paulo, a partir do que foi discutido na Conferência do Urban Age, ainda faltam grandes investimentos em transporte de massa, elementos de gestão metropolitana, de gestão urbana e financeira para transformar São Paulo numa metrópole contemporânea.

 

Referências bibliográficas

Abascal, Eunice. A recuperação urbana de Bilbao como processo dinâmico e polifônico. Tese de doutorado, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo, São Paulo, 2004.

Emurb. Caminhos para o centro. São Paulo. São Paulo: Prefeitura de São Paulo/Emurb/CEM/Cebrap, 2004.

Lungo, Mário (Org.). Grandes projectos urbanos. San Salvador: UCA Editores, 2004.

Morandi, Corinna; Pucci, Paola. Prodotti notevoli. Milão: Francoangeli, 1998.

Portas, Nuno. "L'emergenza dei projeto urbano". In: Revista Urbanística, n. 110, 51-67, Roma, 1998.

Somekh, Nadia; Silva, Luís Octávio da. O centro de São Paulo: reconstrução coletiva e gestão compartilhada. Documento. São Paulo, s/d.

Somekh, Nadia; Leite, Carlos. Implementing Urban Change. Urban Age, São Paulo, 2008.

 

 

Nadia Somekh é professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie